terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

DIPLOMATAS BRITÃNICOS CONCLUEM: É IMPOSSIVEL TRADUZIR O "JEITINHO BRASILEIRO"

A diplomacia é feita – também – veneno ( ver post anterior). Em um dos mergulhos que dei na papelada armazenada no Public Record Office, em Londres, terminei encontrando uma pérola, misturada a relatórios secretos sobre momentos dramáticos da vida política brasileira : um relatório em que diplomatas de Sua Majestade informam a seus chefes que é tecnicamente impossível traduzir a brasileiríssima expressão “dar um jeito”.


Quem diria: o “jeito” ocuparia as atenções da diplomacia britânica.

Pode parecer uma banalidade. Mas não é: se quiser mergulhar no “universo mental” brasileiro, um diplomata terá de entender o que significa esta instituição que tanto pode ser louvável quanto detestável. O “jeito” é louvável quando – por exemplo – o brasileiro reinventa uma criação estrangeira – o futebol, por exemplo. Mas pode ser detestável quando significa frouxidão moral e falta de compromisso.  Quem conseguiria traduzir com fidelidade o que significa o “jeito brasileiro”? Atenção, sociólogos, antropólogos  e pitaqueiros em geral:  eis um tema à espera de um estudo sério. Já que diplomatas estrangeiros acham que o jeito é uma instituição  ”intraduzível”, bem que um pesquisador nativo poderia tentar esmiuçar esta grande invenção brasileira. O que diabos é “dar um jeito” ?

Onde é que termina a criatividade e começa a enganação?  Qual é o exemplo mais espetacular de um “jeito brasileiro”?  a história política traz uma coleção de exemplos:  os militares estavam querendo evitar que o vice-presidente João Goulart tomasse posse no lugar do presidente que renunciou?  O “jeito”  foi adotar um regime parlamentarista para diminuir os poderes do presidente.  Não deu certo? O “jeito” foi convocar um plebiscito para que o povo decidisse entre parlamentarismo e presidencialismo. E assim por diante). A Embaixada britânica enviou a Londres, no dia 17 de agosto de 1962, um relatório em que informa que os brasileiros poderiam dar um “jeito” na crise crônica que marcava o governo Goulart:

 “O único sinal de conforto que ouso oferecer é dizer que os brasileiros têm uma palavra para descrever a habilidade em encontrar uma saída para suas dificuldades : “jeito”, uma palavra intraduzível em qualquer outra língua, mas que significa, genericamente, um estratagema ou acordo de bastidores. Com frequência, “dar um jeito” não é nem sério nem inteiramente moral,mas é bastante eficiente. Tenho estado no Brasil por tempo suficiente para não afastar a possibilidade de que um “jeito” será encontrado para resolver a crise atual”.

(A quem interessar possa: o documento foi publicado no nosso livro “Dossiê Brasil”, já esgotado, mas encontrável nos sebos…O Dossiê Geral publicará, nas próximas semanas, trechos de despachos diplomáticos “venenosos” : são documentos que, depois de passarem décadas mantidos em sigilo, são finalmente abertos à consulta pública)

FONTE: DOSSIÊ GERAL - O BLOG DAS CONFISSÕES - GENETON MORAES NETO

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